sexta-feira, 30 de outubro de 2020

EDUCAÇÃO SEXUAL: por que é importante insistir tanto nela?



Afinal, o que é a educação sexual? E por que ainda precisamos brigar por ela?

"A sexualidade humana forma parte integral da personalidade de cada um. É uma necessidade básica e um aspecto que não pode ser separado de outros aspectos da vida". Assim, a OMS abre sua definição sobre sexualidade. Falar de educação sexual é falar da construção do indivíduo de uma forma ampla, de ensiná-lo a se reconhecer como pessoa, de adquirir respeito ao próprio corpo e de estabelecer limites para o próximo. Há quem diga, no entanto, por ignorância ou má-fé, que educação sexual é uma forma (ou projeto político 🙄) de erotizar crianças, ensiná-las a fazer sexo ou de introduzir a tal “ideologia de gênero” nas escolas... 

(Um minuto: 🚨 antes de prosseguirmos é importante que seja reforçado que IDEOLOGIA DE GÊNERO não existe. Obrigado pela atenção. Vamos prosseguir! 🚨)

Conhecer o próprio corpo e entender quando algo não está adequado é muito importante em todas as idades. Inserir educação sexual nas escolas tem como objetivo ajudar crianças e adolescentes, adultos e idosos, a compreenderem as suas relações com a sua construção de ser e aprender. A educação sexual favorece a reflexão sobre a sexualidade, não só com informações diretas, mas também promovendo discussões de forma ampla e saudável sobre valores, crenças, pré/conceitos, experiências individuais e sentimentos.

Vou aqui tratar de quatro pontos (apenas quatro de muitos!) de como a educação sexual poderia ajudar:

  1. Prevenção à violência sexual. Quantas mulheres próximo a você já foram assediadas ou abusadas sexualmente? Tenho certeza de que conhece alguém. Agressores não reconhecem as vítimas como sendo donas de seu próprio corpo. Educar desde pequeno a reconhecer o que pode ou não ser tocado, a autonomia do corpo do outro é parte da educação. Mais uma informação: segundo o Ministério da Saúde, três crianças são abusadas sexualmente a cada hora no Brasil. Nove de cada 10 casos de violência sexual contra crianças, o agressor é alguém próximo (e de confiança) da vítima. Você já parou para pensar em quantos casos de abuso sexual em crianças e adolescentes poderiam ser evitados se ela soubesse o que estava acontecendo ali e conseguisse, de alguma forma, se defender?

  2. Respeito às identidades. Pessoas LGBTQIA+ sofrem continuamente bullying por conta da identidade de gênero e ou da orientação sexual, causando traumas e transtornos que persistem por anos e, por vezes, nunca tratados. Abordar a sexualidade, envolvendo orientação sexual e discussões relativas à questões de gênero, não vai alterar a essência de ninguém. E mais, vai evitar a intolerância e crimes baseados puramente no ódio. 

  3. Redução de gravidez na adolescência ou de gestações não planejadas. Já é bem conhecido que abstinência sexual não é política de saúde pública. Simplesmente não funciona! A educação sexual tem como um dos princípios a orientação sobre o momento adequado para iniciar a vida sexual e o uso correto de contraceptivos. O desconhecimento ou vergonha dos pais (que não tiveram educação sexual!) em falar sobre sexualidade e sexo com os filhos acaba fazendo com que muitos comecem a se relacionar sexualmente sem nenhum tipo contracepção.

  4. Redução de infecções sexualmente transmissíveis. Existem diversas formas de se evitar uma IST. Essas estratégias não se restringem apenas a usar camisinha... Você conhece as demais? Não? Ter uma educação sexual poderia lhe auxiliar a ter todos esses conhecimentos. Falarei mais sobre essas ferramentas em outros posts!

Mas "Qual seria a melhor idade para iniciar a educação sexual?” Todos que convivemos com crianças e adolescentes, participamos do seu desenvolvimento e os educamos sexualmente de forma contínua, através dos nossos exemplos, do que é permitido ou proibido, de como nos relacionamos com as pessoas que amamos, dos nossos limites, direitos e obrigações…

Antes de tudo, é importante se atentar para a idade e para as demandas que cada um possui. Em casa, o momento para se iniciar uma conversa sobre sexualidade (ou sobre sexo) deve ser a partir do interesse da criança ou do adolescente. As repostas devem ser dadas de forma natural e compatíveis com o entendimento dele(a)s - sem nunca infantilizar as respostas.

A escola tem um papel importante. A educação sexual deveria se iniciar ainda na pré-escola e seguir-se continuamente. O assunto é extenso, mas na pré-escola por exemplo, poder-se-ia trabalhar conceitos básicos de respeito e cidadania. Parece fugir do assunto? Mas vejam: ensinar a respeitar o outro e explicar o conceito de propriedade, abraçaria questões de gênero e de poder, evitando, por exemplo, casos de abusos sexuais.

Trabalhar a sexualidade ao longo das fases da vida é bem possível - seja em casa ou na escola. Vejam temas que podem ser abordados no início da vida escolar:

  • respeito ao próximo
  • entendimento de público e privado, expandindo para o o respeito ao corpo do outro
  • valorização positiva do corpo
  • cuidado com o outro
  • relações familiares e suas diversas conformações
  • identificação dos tipos de toques para permissão daqueles possíveis... 

A lista é grande. O mais importante é que os temas sejam abordados de acordo com as fases do desenvolvimento da criança, desenvolvendo recursos necessários para poderem se posicionar diante de abusos ou violências, criar vínculos e fazerem escolhas assertivas e responsáveis no futuro.

Ter contato com informações tão importantes ainda na infância ou adolescência pode ajudar o indivíduo a se conectar consigo e com outras pessoas de forma segura, sem tabus e sem preconceitos. Ter informação é preciso! Não se pode negá-la!


Dr. Eduardo Fernandes - CRM/MG: 45.910
Saúde Sexual

Um comentário:

  1. Excelente texto. Tudo os tópicos abordados são de fundamental importância para a formação de um indivíduo autônomo, crítico da realidade e sujeito de sua própria história de vida. Parabéns pelo seu trabalho e posicionamento Dr. Eduardo Fernandes! Gratidão sempre!

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